17/02/18

Polícia moral on-line

Pessoalmente não sou frequentador do Facebook. Em contrapartida participo em rodas de amigos que, por sua vez, são frequentadores do Facebook. Por essa via inteirei-me de várias polémicas que têm circulado nas redes sociais a propósito da vaga de censura puritana que grassa por aí.

Entre os exemplos mais pertinentes estou a lembrar-me de quadros censurados nos museus, de reproduções de arte rasuradas nas ruas, da suspensão de programas televisivos de índole pedagógica que envolvem crianças (pois, se são pedagógicos, é natural que envolvam crianças), de exclamações de indignação face ao manifesto antipuritano pontuado por Catherine Deneuve.

Mas o que mais me impressionou nestas conversas foi o relato das agressões às vozes que se levantaram contra a censura, o puritanismo velado e outras atitudes do mesmo quilate – todas foram, segundo entendi, insultadas, zurzidas (virtualmente, claro está) e até banidas, num tipo de atitudes que não deve ser confundido com o debate enérgico de ideias. Confunde-se, isso sim, com a censura de costumes e ideias.

Quem sofre as agressões – e até quem, não participando na peleja, se limita a assistir – não pode deixar de se sentir intimado a refrear as suas ideias, a ter cautela na expressão da sua autonomia intelectual, tenha ou não tenha razão. Até porque o que está em causa não é a razão, mas sim a aprovação social, a conformidade a normas sociais imperativas que pouco a pouco se vão estabelecendo em domínios donde tinham sido expulsas. A penalidade maior é o ostracismo social (em rede).

Foi assim que me dei conta duma coisa que já presenciava há muito, mas que se ia esquivando à minha consciência: as redes sociais do tipo Facebook só na aparência são instrumentos de expressão pessoal; elas tornaram-se efectivamente um instrumento de controlo moral e social. São a janela por onde se espia o alheio. São a bitola por onde se afere a conformidade a modelos sociais cada vez mais apertados e imperativos. São as seteiras por onde se assestam os dardos da punição.

Posto isto, tenho de reconsiderar muito seriamente se as abundantes sessões de masturbação de homens e mulheres on-line, na intimidade dos seus quartos, serão meras demonstrações narcísicas ou se devem ser sustentadas (por nós, resistentes) como gritos de revolta prazenteira.
 

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