14/05/11

O exemplo equatoriano (1)

O povo português tem sido levado a acreditar que certas dependências e sujeições ao poder económico-financeiro são inevitáveis; que as soluções alternativas são irrealistas, impraticáveis ou mesmo pueris.

Nada mais falso. Iniciamos aqui a publicação duma série de resumos informativos destinados a contribuir para a reflexão sobre vias alternativas.

A nova Constituição equatoriana (2008)
O Equador aprovou em 2008 uma nova Constituição que apresenta aspectos radicalmente inovadores.

Entre as inovações dignas de nos deixarem verdes de inveja, destacamos os capítulos relativos à dívida pública e à protecção da natureza.

Para consultar mais documentação sobre o tema, ver CSI (em português) e CADTM (em francês).

A questão da dívida pública no direito constitucional equatoriano
A secção «Endividamento Público» reza assim:
Art.º 290 – O endividamento público ficará sujeito às seguintes regras:
1. Recorrer-se-á ao endividamento público apenas quando a receita fiscal e os recursos provenientes da cooperação internacional sejam insuficientes.
2. Velar-se-á que o endividamento público não afecte a soberania nacional, os direitos humanos e o bem-estar e preservação da natureza.
3. O endividamento público servirá exclusivamente para financiar programas e projectos de investimento de infraestruturas, ou capazes de gerarem reembolso. Só será permitido refinanciar a dívida pública externa quando as novas condições sejam mais vantajosas para o Equador.
4. Os acordos de renegociação não deverão conter nenhuma forma tácita ou expressa de anatocismo [=juros sobre juros, ou juros compostos] ou usura.
5. As dívidas declaradas ilegítimas por órgão competente serão impugnadas. Em caso de ilegalidade declarada, exercer-se-á o direito de indemnização [pelos prejuízos causados].
6. O direito de acção judicial contra actos de responsabilidade administrativa ou civil decorrentes da gestão da dívida pública nunca prescreve.
7. É interdita a «estatização» de dívidas privadas.
(...)
Art.º 291 – Os órgãos competentes, determinados pela Constituição e pela lei, realizarão análises financeiras, sociais e ambientais prévias do impacto dos projectos que impliquem endividamento público, a fim de determinar a viabilidade de financiamento. Estes órgãos realizarão o controle e a auditoria financeira, social e ambiental de cada fase do endividamento público externo e interno, tanto na fase de contrato como na de gestão e renegociação.
[tradução de Rui Viana Pereira; fonte: Constituição do Equador, versão de bolso, em castelhano]

Brevemente publicaremos um artigo sobre o resultado prático da política equatoriana para a dívida externa.


A Natureza como sujeito de Direito na Constituição equatoriana
Na sua secção VII, a Constituição coloca a natureza como sujeito de direitos. É a primeira constituição na história mundial a adoptar esta abordagem, estabelecendo os seguintes princípios:

O meio ambiente é considerado como sujeito de Direito ao qual se devem subordinar as funções económicas e sociais.
A água, além de ser considerada um mero recurso natural, passa a ser vista como um «bem nacional de uso público» e «estratégico», «essencial para a vida humana».

O Direito da natureza inclui não só a sua preservação, mas também a sua restauração.

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