Dezembro-2007
O Equador declara a sua decisão soberana de se retirar do CIRDI (Centro Internacional para a Resolução de Diferendos Relativos a Investimentos).É um acto soberano, legal, inatacável, que produz efeitos jurídicos internos e externos.
Resulta deste passo político que o Equador se subtrai à alçada jurídica e política do FMI e do Banco Mundial.
É preciso sublinhar que a retirada do CIRDI não deixa o país indefeso do ponto de vista internacional – pode continuar a recorrer para os tribunais internacionais competentes para declararem ilegítima, odiosa ou ilegal uma parte da dívida.
25-Julho-2008
O Equador conclui a elaboração de uma nova constituição, como já referi em artigo anterior.Pela primeira vez na história mundial das repúblicas a dívida pública passa a ser regulamentada, auditada ou mesmo proibida em numerosas circunstâncias.
Pela primeira vez na história da Humanidade, a Natureza passa a ser sujeito de Direito, com prevalência sobre as funções sociais, políticas e económicas.
Bem-vindos ao novo Equador. Bem-vindos a um país que tem por moeda o dólar americano mas estabelece como base condicionante das relações económicas o bem-estar comum. Bem-vindos a um país onde o Estado se compromete a regular efectiva e directamente (ou seja, sem parcerias público-privadas, ao contrário de Portugal e do Brasil) os recursos naturais, o petróleo, a água, as telecomunicações, as estradas, os transportes públicos, a educação, a saúde... Bem-vindos ao «socialismo do século XXI».
Setembro-2008
O Equador, enquanto Estado soberano, decide criar uma comissão de auditoria da dívida, a fim de se pronunciar sobre a sua legitimidade ou ilegitimidade.Esta decisão é um acto interno, soberano; produz automaticamente efeitos jurídicos nacionais e internacionais. À semelhança de qualquer outro país, o Equador não tem de consultar os seus credores externos para tomar esta decisão.
Ao tomar esta decisão, o Equador, se quisesse, poderia ter suspendido o pagamento da dívida até às conclusões da comissão de auditoria. Não o fez (o que é discutível), mas poderia tê-lo feito em conformidade com a legalidade interna e externa.
A posição do Equador (ou de qualquer outro Estado soberano) nesta matéria foi declarada justa e intocável à face da lei internacional, pelo 1º Encontro Internacional de Juristas, realizado em Quioto (8-9 Julho 2008).
Não há que ter medo – a lei internacional está do lado de quem paga, de quem é explorado, de quem busca o bem-estar das populações em primeiro lugar, não do lado da agiotagem financeira.
Por outro lado, uma das questões cruciais da batalha contra a dívida reside na composição da comissão de auditoria e nos seus objectivos:
Membros da Comissão de Auditoria Integral do Crédito Público
Representantes oficiais
Representantes oficiais
- Ministro de Economía y Finanzas
- Procurador de la Nación
- Contralor General (En calidad de Asesor)
- Presidente de la Comisión de Control Cívico de la Corrupción
- Jubileo 2000, Red Guayaquil
- Centro de Derechos Económicos, Sociales y Culturales (CDES)
- Acción Ecológica
- El Consejo Latinoamericano de Iglesias (CLAI)
- La Confederación Nacional de Indígenas del Ecuador (CONAIE)
- Red de Mujeres Transformando la Economía (REMTE)
- Lucia Fattorelli y Alejandro Olmos de la Red Jubileo Sur
- Federación Luterana Mundial
- Gail Hurley y Jürgen Kaiser de la Red Europea de Deuda y Desarrollo (EURODAD) y Jubileo Alemania
- Oscar Ugarteche y Eric Toussaint de la Red Latinoamericana de Deuda, Desarrollo y Derechos (LATINDADD ) y Comité por la Anulación de la Deuda del Tercer Mundo (CADTM)
Funções da CAIC – ver doc – essencialmente trata-se de listar todos os documentos pertinentes, criar uma base de dados pública, colocar toda a informação encontrada ao dispor de todos os cidadãos. A seguir os cidadãos tomam democrática e soberanamente a decisão que acharem mais conveniente.
Novembro-2008
O presidente do Equador, Rafael Correa, anuncia a suspensão do pagamento de 30,6 milhões de US$ referentes a títulos de dívida «Global 2012», que venceriam em 15-11-2008. Esta declaração assenta nas conclusões da auditoria (ver documentação em Auditoria Cidadã da Dívida, entre outros). Os títulos da dívida em causa elevavam-se a 250 milhões de dólares, a um juro de 12%.«Até 15 de Dezembro decidiremos se continuamos a pagar ou se iremos para os tribunais, porque as renegociações da dívida foram um autêntico hold-up para o país», anunciou o chefe de Estado Rafael Correa, acrescentando que «existem provas sérias da nulidade dessa dívida».
Junho-2009
O Equador anuncia a sua decisão soberana de anular uma parte da dívida, representada pelos «Títulos Global 2030 e 2012» – são 85% da dívida externa comercial do Equador, ou seja, da dívida externa perante os bancos privados internacionais... que «curiosamente» são os mesmos responsáveis pela crise financeira internacional.91% destes credores aceitaram uma redução de mais de 65% do valor nominal do stock dos títulos de dívida (cerca de 2000 milhões de US$).
Esta atitude representa um precedente para o mundo inteiro, demonstrando que é possível os governos defrontarem a questão da dívida de forma soberana.
2900 milhões de US$ em títulos de dívida foram retirados do mercado internacional.
Assim o Equador economiza nos próximos 21 anos 7280 milhões de US$; ou seja 330 milhões por ano; ou seja 30 milhões por mês.
«Revoltámo-nos contra um sistema que impõe dívidas odiosas, injustas, ilegais, imorais, contraídas de forma irregular, sem o consentimento explícito do nosso povo», afirmou o presidente Rafael Correa.
Porque são estes acontecimentos desconhecidos da opinião pública mundial? Como é possível que a comunicação social portuguesa não lhes tenha dado eco?
Primeiro, porque a decisão soberana do Governo equatoriano constitui o maior golpe de todos os tempos no poderio económico e político da finança mundial. É um precedente «perigoso», um incitamento à revolta de todos os outros povos. O poderio financeiro vê-se encurralado e reage silenciando as redes de comunicação social.
Segundo, porque a comunicação social portuguesa (à semelhança de muitas outras) não passa hoje, na sua generalidade, de uma «voz do dono» obediente e acéfala.
Terceiro, porque os militantes das redes de comunicação digital em Portugal sofrem de algumas maleitas semelhantes às dos órgãos de comunicação social: não vêem nem estudam mais longe que a pequenez das suas fronteiras.
Março-2010
A exploração petrolífera do parque de Yasuní poderia render ao Estado equatoriano entre 5 e 6 mil milhões de dólares. Mas esta exploração, além dos prejuízos que provoca a nível global e do agravamento do efeito de estufa, implica a destruição de parte da floresta amazónica equatoriana. Por isso o Equador põe como condição para a exploração petrolífera no território (se esta não puder ser impedida) a retribuição de pelo menos 50% dos lucros de exploração, a fim de combater os estragos provocados na biodiversidade amazónica e na vida social.(Ver docs e pormenores desta iniciativa revolucionária.)
Fevereiro de 2011
O Equador bate todos os recordes mundiais em matéria de indemnizações impostas a empresas multinacionais que provocaram estragos sociais e ambientais – a Chevron Texaco foi dada como culpada nos tribunais internacionais pelos prejuízos causados entre 1964 e 1990 e terá de pagar 9500 milhões de dólares.É um precedente legal histórico, tanto pelo conteúdo como pelo montante.
Trago aqui este resumo muito genérico e breve dos acontecimentos no Equador com algumas intenções:
nota: algumas horas depois da publicação deste artigo reparei que outro, complementar, foi publicado aqui.
Primeiros resultados da auditoria da dívida no Equador.
Suspensão do pagamento dos juros da dívida no Equador.
http://www.ilmanifesto.it/oggi/art48.html.
Decisão soberana de declara a anulação da dívida do Equador.
Auditoria Cidadã da Dívida, lista de documentos sobre o Equador.
A Iniciativa Yasuní ITT.
Indemnização pelos prejuízos ambientais e sociais causados no Equador.
O Equador como novo modelo constitucional em matéria de dívida.
- Ajudar as assembleias populares em curso em diversos pontos de Portugal a reflectir sobre a questão da dívida soberana. Não pretendo impingir soluções, apenas fornecer alguns dados baseados em factos reais e o exemplo de outras lutas semelhantes levadas a cabo com sucesso.
- Embora seja compreensível o medo das populações perante a ideia da auditoria, da renegociação da dívida ou mesmo da sua anulação, este medo sem razão evidente resulta da propaganda oficial das correntes neoliberais, e da propaganda oficiosa, aparentemente «neutra», veiculada pela «voz do dono», isto é, pelos órgãos de comunicação social. Disto já falei em artigo anterior. No entanto o exemplo do Equador prova que as opções soberanas, sejam elas quais forem, são possíveis, não são utópicas mas sim eficazes, não implicam o fim do mundo mas sim um maior bem-estar das populações.
- É absolutamente indispensável criar redes independentes e honestas de informação, baseadas em redes digitais (e portanto mais facilmente independentes do poder económico).
- Olhando atentamente para os documentos disponíveis sobre os últimos 8 anos de história do Equador, verificamos que, para além da coragem imensa desse povo e de alguns dos seus dirigentes políticos, a solidariedade internacional desempenhou um papel indispensável. Sem as acções de solidariedade internacional, a revolução equatoriana poderia ter sido irremediavelmente esmagada. É necessário que os activistas e as redes sociais portuguesas se liguem às redes internacionais, estudem os processos de outros países, abandonem as fronteiras ridículas do seu Portugal dos Pequeninos e apelem ao auxílio solidário das redes e movimentos sociais internacionais através de objectivos e propostas concretas de acção.
nota: algumas horas depois da publicação deste artigo reparei que outro, complementar, foi publicado aqui.
fontes:
Geral, sobre a anulação da dívida em todo o mundo: CADTM.Primeiros resultados da auditoria da dívida no Equador.
Suspensão do pagamento dos juros da dívida no Equador.
http://www.ilmanifesto.it/oggi/art48.html.
Decisão soberana de declara a anulação da dívida do Equador.
Auditoria Cidadã da Dívida, lista de documentos sobre o Equador.
A Iniciativa Yasuní ITT.
Indemnização pelos prejuízos ambientais e sociais causados no Equador.
O Equador como novo modelo constitucional em matéria de dívida.
Boa! Foi bom conhecer este blogue.
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