Ainda mal passaram 48 horas sobre a minha última
crónica e já me sinto compelido a voltar ao assunto. As razões
para este retorno prendem-se com as manobras políticas em curso, nas
quais, na minha opinião, Robles, agora ex-vereador da CML, não
passa de um peão. No essencial:
-
Parece existir uma manobra política para descredibilizar do BE e reatar o namoro PS-PSD.
-
A mira dos ataques parece estar a deslocar-se de Robles para os movimentos sociais que lutam pelo direito à habitação e à cidade, contra a mercantilização da habitação e a especulação imobiliária desbragada.
1. As manobras de namoro político entre o PS e
o PSD
A comunicação
social dominante e as redes sociais deram um destaque absolutamente
desproporcionado ao caso
Robles. A CML (Câmara Municipal de Lisboa), a AR (Assembleia da
República), o Governo e a Presidência estão repletas de casos de
corrupção e conflitos de interesse bem mais graves que o de Robles
– e no entanto não vemos
a totalidade dos principais
periódicos dedicarem as suas primeiras
páginas ao assunto, como
fazem com Robles, nem lemos
milhares de comentários por
dia nas redes sociais a
mandar abaixo os tubarões instalados nos diversos níveis do poder.
Nesta
tragicomédia com honras de
primeira página, o
gato escondido
por detrás das cortinas dos bastidores é, creio eu, a vontade de
viabilizar e reatar
o namoro entre o PS e o PSD. Na verdade, eu não saberia dizer se a
iniciativa de lançar esta campanha à volta de Robles partiu da
direita ou … do próprio PS.
2. O ataque aos movimentos socais
Curiosamente,
a posição mais correcta dentro
do BE acabou
por vir
do próprio Robles, que se demitiu com o justíssimo argumento de que
deixou de ter condições políticas para exercer o seu cargo de
vereador, pelas
mesmíssimas razões que apontei no
meu artigo anterior.
A lisura desta saída devia ter posto ponto final ao falatório, mas
afinal
funcionou como gasolina atirada à fogueira. Visto o
fogo mais de perto, julgo
podermos deduzir
que ele não se extingue porque
um dos alvos principais da campanha (senão o principal) ainda não
foi atingido: a descredibilização dos movimentos sociais. A
intenção raivosa de destruir os movimentos sociais que lutam – de
facto e não apenas ao nível do discurso político –
pelo
direito à habitação transparece
nos ataques às
associações cívicas, entre
as quais pontua
a Habita.
Nesta
nova fase da campanha, os
movimentos sociais
são
acusados de
estarem infiltrados por
militantes do BE. O
argumento poderia ser qualificado de obtuso,
se não fosse clara a sua
intenção
de descredibilizar os movimentos sociais, uma vez que activistas,
militantes e simpatizantes de todos os partidos, de todo o espectro
político, da extrema esquerda à extrema direita, existem em toda a
parte da sociedade, sem excepção. A única maneira de acabar com
eles é chamar Salazar a levantar-se da tumba e pôr fim a toda a
participação democrática e cívica na nossa sociedade, se
necessário com recurso à tortura.
É portanto uma acusação que, não sendo estúpida, só pode ser
espurca e
autoritária.
O
ataque aos movimentos sociais é tanto mais oportuno para a direita e
para os especuladores imobiliários, quanto dentro de mês e meio (21
a 25 de Setembro) se realiza em Lisboa um encontro internacional de
activistas europeus pelo direito à habitação e à cidade, contra a
especulação imobiliária e a apropriação privada de todos os
espaços públicos e habitacionais. Notem:
ainda
os movimentos sociais não fizeram o trabalho de divulgação da
iniciativa – que já
deviam
ter iniciado
há
muito tempo,
sendo
este desmazelo ou menosprezo pela comunicação pública uma falha
grave que tem de ser apontada e
discutida –,
já os
seus opositores,
sempre muito atentos,
iniciaram a campanha de descredibilização dos organizadores
da iniciativa.
A
eficácia da direita é de facto admirável. E a inexperiência,
desorganização e desmazelo dos movimentos sociais portugueses tem
de ser corrigida.
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